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23 August 2005

 

Os sentimentos

Um sentimento é tão real e objectivo como um tijolo, um projecto ou uma dívida. Tão objectivo que há sentimentos que provocam úlceras, e até o cancro, segundo dizem. E, ao contrário, é necessário percebê-lo, há sentimentos que geram saúde, bem-estar, qualidade de vida.
António Damásio até mostrou que, se eu quiser ir do emprego para casa só pela lógica, ser-me-á impossível. Só as emoções e os sentimentos me farão lá chegar.
Por isso, não há nenhuma razão para os sentimentos terem tão má fama em parte da nossa vida social. Muito menos serem desprezados como degradação e incapacidade.
Se um sentimento é real e objectivo, então cada um sente o que sente e não o que o outro pensa que ele deve sentir.
Também se pode dizer que
cada um sente pelas suas razões e não pelas minhas.
Por isso, torna-se necessária atenção, uma escuta atenta àquilo que os outros sentem.
E não vale a pena dizer que ele ou ela devia ou deve... sentir isto ou aquilo. Porque cada um só sente o que sente. E o verbo sentir não tem imperativo. "Ama-me", como forma de imperativo, é uma confissão de estupidez.
Pelo contrário, qualquer sedutor sabe a regra elementar. Para que o outro tenha um sentimento que eu desejo ou quero que ele tenha, é necessário semear primeiro, para depois poder colher.
Alguns sentimentos semeiam-se facilmente, mesmo sem querer, enquanto outros exigem uma sementeira cuidada e um acompanhamento continuado.
Os sentimento são a matéria prima da vida. E quem não o sabe terá de descobri-lo. E quanto mais tarde, pior.

 

As minhas razões, as tuas

Não sei porquê, mas é verdade. Tenho alguma dificuldade em fazer compreender aos meus alunos algo que me parece simples. E é. Porque. Lá chegados, também se lhes torna simples e evidente. Mas parece que vai contra o senso comum. Assim.
Cada um move-se pelas suas razões, não pelas minhas.
Até aqui, tudo bem. Parece fácil. Pois há lá alguma dificuldade em perceber que as outras pessoas não se movam pelas minhas razões, mas cada um pelas suas. E o meu leitor ou ouvinte percebe sempre que ainda bem, se move pelas suas razões e não pelas minhas. E quem sou eu para querer que todo o mundo se mova pelas minhas razões?
É fácil de perceber. Portanto, não é aqui que está a dificuldade. Mas é logo aqui ao lado, quando se diz o mesmo mas noutra perspectiva.
Ninguém se move pelas tuas razões, mas pelas suas.
Quem é que está disposto a perceber – e a aceitar, porque este perceber é incorporar em si - sim, quem é que está disposto a perceber e a aceitar que os outros se movam pelas suas razões e não pelas "minhas"? E sentir que assim é que está bem, que felizmente cada um se move pelas suas razões. E, em consequência, disposto a dialogar a um nível de respeito pelas razões dos outros e, se possível, a fazê-lo entender e, oxalá, partilhar as razões.
E perceber que se alguém se porta de um certo modo é porque tem as suas razões para isso.

21 August 2005

 

Os incêndios, o logro

É triste chegar a Abrantes e encontrar este espectáculo de churrasco colectivo. Churrasco porque é, sem dúvida, muito de nós que está a arder. E a arder em vários sentidos. Desde logo, o mais visível, a arder a floresta e, com ela, as nossas condições de vida. Depois, a ardermos nós próprios, consumidos no logro em que nos afundamos.
Não é verdade que, desde há vários anos, os nossos bombeiros estão melhor equipados do que nunca? E que, quanto melhor equipados se encontram, menos controle têm sobre os fogos? Portanto, não é aí que está o nó górdio do problema.
Ah, sim, o estado das florestas, pior do que nunca. Mas não é verdade que o estado das florestas tem sobretudo a ver com a propagação dos incêndios e não, em muito, com a sua origem? Quem acredita que é o estado da floresta que origina um incêndio de múltiplas frentes às cinco da manhã? Não, também não é aí que está o núcleo do problema. Embora a falta de limpeza e ordenamento da floresta façam parte do próprio problema. Mas fazer parte não é o mesmo que confundir-se com.
Então... Bem, acontece que não temos sequer uma boa explicação para o que está a passar-se. E uma boa explicação nem sequer pode ser simples, porque se trata de um problema complexo. E a maior verdade é que queremos explicações simples. Que não há nem pode haver. Por isso nos consumimos.
E consumimo-nos na medida em que queremos a explicação que não é possível e não queremos aquela que pode explicar. Por isso, nem vale a pena tentar. Preferimos arder.

P.S. – Faz parte do triste espectáculo humano destes incêndios a população local a assistir, de braços cruzados, ao início de um incêndio. Esperam os bombeiros que só poderão chegar quando já nada houver a fazer, senão controlar alguns estragos. Foi agora, como foi em 2003. Não aprendemos nada. Nem queremos aprender. E, por isso mesmo, nem vale a pena querer ensinar.

15 August 2005

 

Ar de frete

Cada vez tenho menos paciência para festivais de folclore. Não porque o folclore ou a sua expressão em festival me desmereçam o olhar. Bem feito, é um espectáculo como qualquer outro. E dizendo-o, digo tudo. Bem feito.
O que eu não suporto são os dançarinos com ar de enfado, fartos daquilo, com cara de frete. Não andam ali por gosto? Quem os obriga?
Mas não são só e apenas os dançarinos. O que mais me incomoda é que, vendo-os, vejo um pouco do mesmo que vemos todos os dias. O mesmo ar de frete ao balcão da loja, no atendimento de uma repartição, na cara do empregado de mesa, no condutor do autocarro...
Aquela é a expressão em palco de um país de frete, de fazer por fazer sem alma nem vontade, a cara pública da sem-alma com que vivemos. Afinal que andamos cá a fazer. E depois, se assim é, que direitos podemos reclamar a sermos bem atendidos pelos outros?
Depois admiram-se de os e as brasileiras estarem a ganhar postos de trabalho.

07 August 2005

 

Afinal

Afinal, consegui. Foi à segunda. Já não me lembrava como era.

Portanto, sei o que quero fazer aqui. E quero fazer alguma coisa que penso que vale a pena. Vamos ver.

 

- É hoje, é hoje

É dia de voltar. Tinha decidido fazê-lo a 7 do mês passado, mas não consegui.
É evidente que a minha ausência tem um motivo simples. Mas as razões são várias.
O convite, e depois a aceitação, para dirigir o jornal Gazeta do Tejo foi um terramoto que transformou toda a minha vida. Esse foi o motivo.
As razões prendem-se com ele, mas não se confundem. Desde logo, a falta de tempo. O dia é limitado. Mas a cabeça também, não dá para pensar em tudo. Isso quebra ritmos, e coloca novas exigências ao restante. Quando talvez houvesse tempo disponível, não havia disposição interior, ou havia que estar com a família em vez de ir para o computador.
Mas também deixei de saber o que podia e não podia escrever aqui. Quando se dirige um jornal, tem-se outras responsabilidades. Informação? Tem de ser dada no jornal, não posso trazê-la para aqui. Opinião? Como falar aqui do que não digo lá? E que efeitos tem, em termos de jornal, o que eu possa dizer aqui? Passei a não dispor da gramática de leitura do que eu aqui escrevesse. Até porque eu também não dominava inteiramente o que estava afazer no jornal. "O caminho faz-se caminhando". Era a sério.
Não menos importante, se não mesmo o mais importante... Que sentido fazia continuar com este blogue? Que importância tinha dar-lhe continuidade? É verdade que vários amigos me puxaram as orelhas pela minha ausência. Talvez lhes fizesse alguma falta. Ou é presunção minha? Mas isso não é suficiente. Procuro fazer coisas que eu penso que são importantes. A vida é curta demais para fazermos coisas sem sentido. Enquanto eu não visse um sentido que justificasse o tempo e a energia que isto leva, não saberia voltar aqui. Só por fazer, não vale a pena.
Quando iniciei os três blogues, era claro, para mim, o que eles iriam ser. E a valor ou a importância que poderiam ter. Se sim ou não, logo se veria. Aliás, este era, para mim, o último em importância. Mas foi o que dominou. O outro, sobre educação, nem chegou a ser conhecido; e o dedicado à filosofia, nem chegou verdadeiramente, a ser começado.
Hoje, regresso. Penso que encontrei o fio à meada, como se diz em linguagem popular. Algo que valha a pena. Se vale, a ver vamos.
Portanto, aviso à navegação. O barco está lançado à água.
(Alguém acredita que já não sei o código de acesso à edição no blogue? Tenho de, por tentativas, ver se é...)

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