.comment-link {margin-left:.6em;}

24 May 2007

 

A “INDIFERENÇA” matou o meu irmão!

O meu irmão partiu para lugar incerto…
Agora já não há nada a fazer por ele… ”só rezar”, mas quanto não se poderia ter feito?
Quem conheceu o João Carlos, por certo se recordará que, apesar de não ligar importância nenhuma ao assunto, ele parecia vender saúde.
O Médico de Família conhecia-o das vezes que ele necessitou de um atestado médico, para renovar a carta de condução. Pouco mais!
Mas um dia o azar bateu-lhe à porta… teve um aparatoso acidente de trabalho, que o levou ao hospital!
Mas, por mais espantoso que pareça, o João nem ficou internado e até viajou sentado, na ambulância que o transportou.
Foi a partir daqui que teve início, o seu longo e terrível Calvário!
Segundo os médicos, o João não tinha nada… e era indiferente se ele se queixava ou não. Talvez fosse psicológico!
No entanto, nos últimos nove meses de vida dormiu sentado, para contrariar as dores que o atormentavam. Por vezes parava de falar, contraía-se todo, mudava de cor, suportava a dor e, passados alguns minutos, lá voltava ao “normal”.
Qualquer “Olho Clínico” menos especializado verificaria que a situação não era, de todo, muito normal, mas… para o “médico do seguro” o importante era ele voltar a trabalhar, talvez para se poupar uns “dinheiritos” à seguradora.
“- Com que mão é que escreve?”
“- Mas eu sou motorista…”
Muitas anedotas o João contava, ironizando, à conta destes tristes comentários, de quem, no mínimo, se esperaria respeito e educação.
Para o médico de família já não se podia mandar fazer mais exames sem autorização superior. Claro que essa autorização até veio, mais de um mês depois de a terem pedido, quando apenas bastava uma assinatura e, depois desta, ainda teria que esperar mais cinco meses, em lista de espera, até os poder realizar.
Era indiferente! Quem era o João?
O meu irmão partiu para lugar incerto, vítima da indiferença, que nos envolve e consome.
Naquela manhã o meu irmão esmerou-se na apresentação. Ia a Santarém iniciar um processo de adopção. Até Deus pareceu mostrar indiferente ao seu gesto.
A meio do caminho o João sentiu que se aproximava aquela tal dor, que lhe atravessava o peito e lhe prendia os movimentos. Encostou o jipe na berma da estrada e sob o olhar impotente e aterrorizado de sua companheira morreu. Muitos passaram indiferentes à sua aflição e aos seus chamamentos, até que alguém finalmente parou e a ajudou.
Ajudou a responder ao demorado inquérito de quem atende o 112, ajudou a aguentar a demora dos bombeiros ali tão perto, ajudou a aguentar a demora do Veiculo de Emergência Médica, ajudou a suportar toda esta dose de indiferença.
(Obrigado Dra. Doroteia Romão, pela diferença!)
O meu irmão morreu mas a indiferença permaneceu:
Primeiro no hospital onde teve de ficar de sexta até segunda-feira, a aguardar pela autópsia.
Depois pelo motorista da agência funerária, que para além de fechar o carro funerário, que continha a urna e desaparecer por mais de três horas, tentou ganhar tempo acelerando na auto-estrada de forma a perder de vista os acompanhantes, que se deslocaram a Santarém, para poderem acompanhar o meu irmão nesta sua última viagem. Só um telefonema pôs cobro a esta estranha “fuga” e já na portagem de Torres Novas. Era indiferente! Tão indiferente que, depois, ainda fez um desvio e subiu à cidade de Abrantes, com o cortejo fúnebre atrás, para ir buscar uma caixa de flores, para o tradicional negócio durante o velório.
Até um qualquer jornalista do Jornal “O Mirante”, que parecia mais interessado em dizer mal dos bombeiros, inventou uma doença ao meu irmão e lá atestou a causa de morte: “angina de peito”. Era indiferente!
O meu irmão partiu, o que para mim, nunca será indiferente!
Pode ser que alguém aprenda algo com a sua morte e se torne um pouco mais atento e humano, com os que sofrem em silêncio, como ele sofreu!
Até sempre João!
O teu irmão Américo Pereira
In Nova Aliança

Comments: Post a Comment



<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?