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06 February 2006

 

A cidade

Vão adiantados, ao que parece, os trabalhos de arranjo urbano do espaço envolvente dos prédios azuis e brancos em frente ao Lidl. Há décadas que estavam abandonados, cheios de mato e lixo. Agora, a Câmara de Abrantes está a fazer os trabalhos que há muito se impunham.
Mas não basta dizer isto, com toque de elogio pela obra ou de crítica pela demora. O mais importante é darmo-nos conta do que "aquilo" significa.
«A cidade faz-se no espaço que está entre os edifícios", diz Gonçalo Birne, um dos mais prestigiados arquitectos portugueses. Ora podemos ver que aquela urbanização - e urbanização significa, à letra, "fazer cidade" - deitou ao desprezo o espaço "entre" os edifícios. Ou seja, o empreiteiro, quem quer que tenha sido, fez os edifícios, vendeu-os com o lucro que pôde, e deitou ao desprezo a cidade que estava a construir - para os seus compradores e para nós. E os compradores adquiriram um prédio, sem cuidarem da qualidade envolvente, como se fosse insignificante a cidade que estavam a habitar. Uma cidade do desmazelo, do abandono, do lixo acumulado; uma cidade em que cada um, empreiteiro e compradores, tratou dos seus interesses e deixou para a despesa pública os encargos com o espaço entre os prédios; uma cidade que é uma não-cidade, porque se pensou como uma cidade de prédios quando a cidade é efectivamente o espaço entre os prédios.
De então para cá, muita água correu. Mudou a legislação, mudou a nossa sensibilidade para com os problemas urbanos, mudou o pensamento dos autarcas, mudou a posição relativa daquela zona dentro da cidade de Abrantes, mudaram as exigências dos compradores, mudou certamente também a visão dos urbanizadores. Espero que sim. E, se assim for, as urbanizações não serão hoje, meras construções de edifícios com o abandono dos espaços intermédios.
Também neste caso, a situação em que nos encontramos hoje é o resultado do caminho que fizemos. Ou seja, como sempre... para onde quer que vás, já lá estás.

Comments:
Muito interessante este tema.
Na verdade falta-nos ainda uma visão da totalidade que é a arquitectura e a cidade. Quando passamos a olhar em termos de "espaço" e conseguimos superar (mas não abandonar) o deslumbramento imediato da "matéria" começamos a penetrar na essência da arquitectura. Tão importante é o vaso como o vazio que ele encerra. Há uma certa analogia entre o anterior tema em que se confrontavam "elementos" e "campo".
Embora sejamos herdeiros da cultura greco romana que nos ensinou a importância da cidade como coisa pública, hoje há uma tendência para nos queremos esconder nas nossas conchas, nos condomínios fechados, nos centros comerciais, em compartimentos fechados, abandonando a cidade aos elementos.
Falta-nos reaprender a valorizar o espaço público. O tal espaço entre os edifícios que cria a NOSSA cidade. Enfim, faz falta a cidadania.
 
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