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15 January 2006

 

A (des)responsabilização - 1

No seu comentário ao meu post Fritjof Capra (Nov. 95)...
Pedro Oliveira acusa-me de «desresponsabilização do indivíduo»;
hoje,
eu acuso Pedro Oliveira de desresponsabilização dos indivíduos.
(Estamos, apenas, no debate de ideias.)
Vejamos onde é que não nos entendemos, ou onde é que nos separamos.
Dizia a Gabriela (personagem de Jorge Amado): "eu nasci assim, eu cresci assim, eu sou mesmo assim". Ou seja, eu sou assim, não há nada a fazer. Isto é fatalismo, isto é autocondenação, isto é fechamento: não há nada a esperar, porque o que será já está decidido. É claro que eu não subscrevo esta perspectiva. Basta ler o que por aí tenho escrito.
Ortega y Gasset escreveu: «Eu sou eu e a minha circunstância". Atente-se que ele não diz "eu não sou eu, mas a minha circunstância", mas sim "eu sou, em cada momento, o resultado do que sou e da circunstância em que sou, e o que sou em cada momento é o resultado do que venho sendo e da circunstância em que me venho formando". Onde está aqui a desresponsabilização do indivíduo?
O povo diz, e com toda a razão, «temos cinco dedos na mão e todos são diferentes». Basta olhar à volta e ver como, de facto, as coisas se passam assim. Mas o problema é outro: donde vem a diferença?
Os pais gostam de dizer que dão "a mesma" educação a cada um dos filhos. Mas não é verdade. Nem pode ser. Por exemplo: o filho mais velho foi, durante algum tempo, filho único e o segundo nunca o foi, e sabemos como isso faz a diferença; por sua vez, o primeiro era filho único quando lhe nasceu um irmão, coisa que nunca aconteceu ao segundo; o segundo, enquanto cresceu, teve um irmão mais velho, coisa que nunca aconteceu ao primeiro. E assim sucessivamente.
Não, não há duas pessoas que tenham crescido em circunstâncias iguais.
Depois, cada indivíduo é um sistema biológico ultracomplexo, portanto aquilo que se designa como um sistema caótico. Ora um tal sistema é extremamente sensível a pequenas influências. «Um bater de asas de uma borboleta em Pequim pode dar origem a uma tempestade em Nova Iorque.» De igual modo, um pequeno episódio na vida de uma criança pode ter influência decisiva, enquanto pode ter sido insignificante para outra criança.
Por isso, são irrelevantes as perguntas de Pedro Oliveira:
- Valery Gergiev é filho único?
e
- Valery Gergiev foi o único discípulo de Karajan?
Valery Gergiev pode ter tido irmãos e Karajan mais discípulos... e nada do que foi dito fica posto em causa.
Insisto, portanto. Mesmo que Valery Gergiev tenha tido irmãos e Karajan tenha tido mais discípulos... continuo a dizer: Eu sou produto das minhas circunstâncias.
É claro que há, em mim, um património genético, pelo que posso corrigir, se for necessário: Eu sou o produto da minha carga genética e das circunstâncias em que me formei.

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